sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

Notas de um janeiro qualquer

Não existe mudança de um dia para o outro; na verdade, parece que tudo que você faz, em algum grau, não é para você, mas para quem vem depois de você. Legado, posteridade — é assim que justificamos a necessidade de semear ideias, de se reproduzir? Pareço um androide falando. Veja só: o tempo de uma vida não lhe é o bastante. Veja bem: o que não é para a posteridade, a sua porção, aquilo que você consegue aproveitar, acaba depressa, escapa pelos dedos, sopra um vento e apaga a centelha e aí você recomeça a lida em busca de algo mais concreto, em busca de significados; e cansa, escapa, apaga; recomeça, faz diferente, escapa, apaga, aproveita e acaba; é agora, agora vai, escapa, não é para você; centelha tremenda que queima depressa, você então recomeça; sopra um vento na sua porção e você não consegue aproveitar e, não olhe agora, mas aquilo que você tinha por significado concreto acaba de escapar; vai embora a mudança, vai embora um dia para o outro, vai embora as ideias semeadas; fica a lida e os dedos. 

Tolice. “Em busca de significados”. Alguém sabe? O da vida que não é o bastante. 

Aquele que quer saber, não descobre. Mas se sente realmente vivo ao tentar descobrir. O melhor sempre está na experiência. Produzir é obelisco, o produto é subatômico. Investigar um caso é melhor do que o caso em si. A sensação de coração batendo — e de saber que na verdade você não é um androide — acontece no meio e não no fim.

Você está nos meios, no meio, em meio, a meio. Tentando segurar firme, tentando proteger a centelha. Quando conseguir sua porção, pronto, um fim e ponto final, um fim para justificar os meios. Um fim que você define ali na hora e já era. É o momento, você sabe quando ele surge, quando ele surgiu. Sua intuição — que nunca cansa, escapa, apaga — presta para isso, presta para te dizer: você levantou o obelisco e investigou o caso. A mudança, o significado, se houve, aconteceu pela experiência e não pelo legado. Não de um dia para o outro, mas apenas em um momento, um momento que é como um coração tipo centelha, tipo vento. Se a posteridade aproveitar algo da lida dos seus dedos, ok, bom. Quanto a você, a satisfação nos meios, no meio, em meio, a meio, é a sua porção. 

E agora? Recomeçar? Por que não?

Devaneio. Insights de 2021. 

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