domingo, 17 de setembro de 2017

Por que queimamos nossos mortos?

Há quem pense que é um gesto para o corpo, um jeito nobre de impedir a corrupção dos vermes da terra. Isso porque houve épocas em que o costume estrangeiro de plantar os mortos como sementes havia infectado a mente deste povo. Mas não, não é essa a causa das chamas, que se foda o corpo, já não é mais do que uma sombra da pessoa em vida. O gesto é para a alma. O fogo purifica e a alma deve ser purificada. 

Quando vivo, o fogo é um flagelo para o indivíduo. Dor na carne, essa prisão. Foi o tempo que houve homens capazes de andar sobre o fogo, capaz de comer e cuspir chamas, foi o tempo em que a purificação poderia ser feita ainda em vida, a alma, essa arte não esculpida, era uma só com o fogo. Hoje, não há mais feitos grandiosos, a alma tomou a forma desse mundo acabado e cinzento, a forma da sociedade cheia de defeitos e injustiças. Hoje, há morte. E nela a alma finalmente pode retornar ao caminho do fogo.

E é por isso que queimamos nossos mortos. 

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