segunda-feira, 22 de maio de 2017

Erik & Sigefrid

Irmãos. Tão parceiros que evocam a imagem de serem, na verdade, uma só pessoa, em eterna harmonia. Os dinamarqueses seguem essa unidade exemplar, morrem por ela, e assim Erik e Sigefrid, dois senhores da guerra, assumem o manto da mais perigosa ameaça de Wessex.

Mas então Æthelflæd acontece na vida de Erik. Ela também vivia em perfeita harmonia em seu mundo comum, ao lado do pai Alfredo. Letrada, deveria ter lido muitas histórias e poemas que poderiam inspirar sua vida, sua época. Mas comeu da verdade e do conhecimento quando casou, quando descobriu que o romance morreu, que não há Páris e Helena, que ela era moeda política e o seu homem não a considerava mais do que isso, soltando perdigotos em sua cara pálida de susto, lhe montando e lhe espancando. Então ela conhece o lado sujo do mundo em que vive, conhece a verdade — e a engole, em consideração ao pai, o resquício último de seu mundo comum. Só que aí, ela conhece Erik.

Ele, que só sabe o caminho do sangue e do ranger de dentes, do sacrifício e da bebida e da foda, de repente encontra Æthelflæd e, como tudo em sua vida, não nega o instinto, não briga com ele, apenas se joga e, depois da experiência, tudo o mais perde o sentindo. Ela, que deveria continuar sendo uma moeda política para a história contada, se torna mais, muito mais. Æthelflæd, a prisioneira dos dinamarqueses, não pensa que Erik é o inimigo, que ele é a sombra que Alfredo combate. Ela, como ele, também não raciocina o ato, pois já conheceu o verdadeiro inimigo, aquele com quem está casada, que não conseguiria, em uma vida inteira, criar nela o que Erik fez num único encontro. Páris e Helena existem sim, pulsam através deles. 

Na união — um roubando o outro de seu mundo, um terceiro espaço sendo forjado, um espaço deles — comem do fruto. Erik rompe com seu irmão, Æthelflæd rompe com seu pai. E a consequência desses atos em prol do amor não é um Helena Páris, mas sim um Isolda Tristão, um Abelardo Heloísa: separação e morte.

No último episódio, o reencontro: Æthelflæd retorna aos braços do pai e do marido, destruída e frustrada. 

Mas o melhor mesmo é o destino de Erik, muito mais mortal e dramático.

Para que a amada fuja, ele fica e confronta seu irmão. Ambos estão morrendo por dentro por terem de lutar, pois sabem que daquele encontro apenas um sairá vivo. Não há volta. Mas, em algum momento desse trágico fim, é como se houvesse um entendimento. Na canção das lâminas, conversam. E, numa poderosa cena final — Sigefrid pondo a espada na mão do irmão moribundo para garantir sua passagem ao Valhalla — eles voltam a ser um, sem palavras de censura, sem julgamentos... apenas o entendimento seco e simples entre dois irmão num momento último.  

Com o irmão morto, Sigefrid perde o chão e se joga numa batalha impossível de vencer. Ele não tem uma Æthelflæd para se sustentar — Erik era tudo. Então deseja o Valhalla do jeito certo: com a espada na mão, com a luta comendo ao redor. E Æthelflæd, que trespassara o coração de Erik, faz o mesmo com Sigefrid, mas com aço e não com amor, o mandando, como uma valquíria, para o sagrado Valhalla onde poderá voltar a ser um com seu irmão.   

QUE final de temporada dessa The Last Kingdom! A principal vantagem da série pra cima dos livros é justamente esse acesso intimo aos personagens periféricos que, não sei como, conseguem ter arcos bem desenvolvidos em tão poucos episódios!  

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