segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Mentira, cicatrizes e andróides

Sobre essa antologia de contos, digo que:

Sabe a escada da arte de capa, essas boas de cair e quebrar a cabeça numa explosão seca de neurônios cor de rosa? Pois é: pra quem ainda não tem medo de uma escada assim, basta ler o conto Mentira, da Ana Karina Dantas, para sentir, daqui pra frente, vertigem ao descer por uma engenharia maldita dessas. Principalmente, digamos, num dia em que você tenha contado — sem querer, sabe como é — uma mentira por aí, de leve...   

Sabe aquela coisa de metalinguagem, o livro dentro do livro falando sobre o livro, igualmente próprio para explodir sua cabeça enquanto interpreta o texto? Pois bem: isso aparece de uma forma bem bacana lá no conto A união faz a ponte, da Eliana Machado. E o Amor além da escrita, do Pedro Karam, além de te fazer rir de estranhamento, vai te dar uma interpretação diferente da metalinguagem a cada nova leitura do conto. Loucura da boa.

Agora pensa numa narrativa rápida e bem humorada que o Chuck Palahniuk poderia ter escrito e o Quentin Tarantino poderia ter dirigido como o sonho febril de algum dos seus personagens. Pensou? Então: se chama Goodbye Sunshine, da Thaís Scuissiatto. É exatamente aquele tipo de texto gostoso de ler em voz alta — com o tom de voz certo aparecendo naturalmente — numa audiência, pra checar as reações dos ouvintes.

E por um acaso você já ouviu falar que o conto deve ganhar por nocaute, tipo, derrubando o leitor no chão? Então veja bem: se aqui houvesse uma medida do soco mais pesado, O tatuador de cicatrizes, da Gisela Lopes Peçanha, levaria o cinturão. O conto te dá um ponto de vista e você vai junto, compreendendo, sentindo, tudo numa boa e de repente BAM na sua cara e você tem de se abaixar pra recolher os dentes.

E, pode falar, você já escutou alguém dizer que a forma em que a história é contada deve ser mais importante que o conteúdo dela? Então: o charme d'O grande truque do homem desalmado, da Letícia Copatti Dogenski, é a melodia de palavras regionais do sul que flui ágil na narrativa e nos diálogos como se a coisa toda fosse poesia antes de ser conto. E o mais legal do Memória, do Edson Amaro de Souza, é justamente a forma trincada de se contar uma história com 561 referências históricas/literárias dentro do texto (Obs: só achei 561 referências, mas suspeito ter mais 440 escondidas no conto, totalizando um arábico número de mil e uma referências que faria qualquer Sherazade concordar que sim, a forma é mais importante que o conteúdo, hm).  

Essas e mais oito histórias de temática fantástica figuram nas páginas de um livro que tem duração de no máximo dois dias de leitura — o conteúdo influenciando nesse tempo mais que a forma de 160 páginas. 

Vale.

Onde tá? AQUI! 

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