quarta-feira, 20 de novembro de 2013

O Poder da Espada

"Para quem já leu todos os clássicos de fantasia, gosto de indicar autores atuais. Apenas para começar, confira Joe Abercrombie. Você não vai conseguir parar de virar as páginas por um bom tempo, eu garanto..." ─ George R. R. Martin

Sand dan Glokta é um carrasco implacável a serviço da Inquisição de Sua Majestade. Nas mãos dele, os supostos traidores da Coroa admitem crimes, apontam comparsas e assinam confissões ─ sejam eles culpados ou não. Por ironia, Glokta é um ex-prisioneiro de guerra que passou dois anos sob tortura. 

Mas isso nunca teria acontecido se dependesse de Logen Nove Dedos. Ele jamais deixaria um inimigo viver tanto tempo. Só que isso foi antes. Agora ele está decidido a mudar. Não quer ser lembrado apenas por seus feitos cruéis e pelos muitos inimigos que se alegrarão com sua morte. 

Já a felicidade do jovem mulherengo Jezal dan Luthar seria alcançar fama e glória vencendo o Campeonato de esgrima, para depois ser recompensado com um alto cargo no governo que lhe permitisse jamais ter um dia de trabalho pesado na vida. Mas há uma guerra iminente e ele pode ser convocado a qualquer momento. Luthar sabe que, nos campos do Norte gelado, o embate segue regras muito menos civilizadas que as do esporte. 

Enquanto a União mobiliza seus exércitos para combater os inimigos externos, internamente se formam conspirações sanguinárias e um homem se apresenta como o lendário Bayaz, o Primeiro dos Magos, retornando do exílio depois de séculos. Quem quer que ele seja, sua presença tornará as vidas de Glokta, Jezal e Logen muito mais difíceis. Agora a linha que separa o herói do vilão pode ficar tênue demais.

Imagine um típico mundo de fantasia medieval com criaturas esquisitas tocando o terror em alguns lugares, magia das poderosas acontecendo de forma subliminar, aspectos de uma civilização e uma guerra em seu prólogo. Imagine que esse é o cenário bem interessante que o senhor Abercrombie desenvolve para revelar sua verdadeira arma secreta, a montante que torna sua literatura absurda: os personagens. A porcaria dos personagens ─ como diria sua narração revoltada, violenta, com xingamentos lá e cá.

Ah, belos personagens. Cada qual com seus buracos no que consideram moral e valores. Personagens bem fáceis de se identificar em muitos pontos, desde a arrogância de Jezal até o realismo de Logen. Personagens vivendo situações bem humanas ─ como a luta diária de subir uma escadaria sendo a droga de um aleijado. E pode acreditar, esses trechos triviais na mão do autor em questão são tão bons quanto os combates e emboscadas que acontecem.

O aleijado, aliás, é um dos melhores personagens que já tive contato: Glokta, um sujeito que tivera glória até certo momento, quando foi torturado e virou uma sombra do que um dia fora, se tornando amargurado com a própria vida, irônico, com um humor que pinga veneno em todos à volta. E atualmente ele é muito bom no que faz ─ torturar as pessoas.

Logen é o outro cara que muito me surpreendeu. É um dos personagens mais comuns, tirando o fato de que ele conversa com espíritos... seja lá como isso funcione exatamente. Até que no fim, num brilhante penúltimo capitulo todo feito de perseguições e combates frenéticos, Logen ─ que até aqui não tinha lutado pra valer ─ faz justiça à sua fama de carniceiro sanguinolento, embora os créditos não sejam inteiramente seus, cabendo um link para o fato dele falar com espíritos...

Tem um comentário na orelha que diz assim:

“Além das excelentes caracterizações e de uma construção de mundo fascinante, Abercrombie escreve as melhores cenas de luta que li. Fico feliz que o pacote completo seja tão bom, mas eu poderia facilmente recomendar O poder da espada só pelas cenas de luta.” ─ SFSite 

E de fato, eu poderia recomendar este livro só por causa deste penúltimo capitulo. Mas tem muito mais coisas interessantes ai no meio. Como a maneira que a magia é narrada. Digo, as palavras escolhidas para a cena, brincando, nunca formando algo direto como "fulano conjurou sua diabrura e boom", mas sim embaralhando frases para demonstrar a confusão do personagem x ao ver aquela merda toda acontecer logo ao lado. 

Pois aqui a magia simplesmente acontece, tão natural quanto andar ou coçar a cabeça. Basta pensar e pronto. Por isso, acaba sendo sutil na maioria dos casos em que surge, acontecendo sem que se perceba exatamente. Mas dá para sentir que algo não está certo. Ao mesmo tempo, a magia pode ser terrivelmente espalhafatosa, como quando Bayaz diz algo como "agora estou com raiva", matando um inimigo instantaneamente numa implosão de sangue e ossos.

É ótimo quando você embarca numa aventura sem saber o que pode acontecer no caminho e, com pouco tempo de viagem, já começa a gostar da maneira como as coisas caminham. O Poder da Espada é mais ou menos assim, o comentário do Martin servindo de Norte para sua viagem. E o melhor é saber que a viagem não termina aqui, sendo que este livro é só o ponto de partida para uma trilogia chamada A Primeira Lei.  

Pelos poucos cabelos de Bayaz, leia o inicio do livro AQUI! O primeiro capitulo, do Logen, deve bastar.  Aposto minha mão.

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