sexta-feira, 22 de março de 2013

O Último Reino

“Sou Uhtred, filho de Uhtred, e esta é a história de uma rixa de sangue. É a história de como tomarei de meu inimigo o que a lei diz que é meu. E é a história de uma mulher e de seu pai, um rei. Ele era meu rei, e tudo o que tenho devo a ele. A comida que como, o castelo onde vivo e as espadas de meus homens, tudo veio de Alfredo, meu rei, que me odiava.”
Uhtred nasceu na aristocracia do reino da Nortúmbria. Órfão aos 10 anos, o menino é capturado pelos dinamarqueses, que lhe ensinam o modo de vida viking. Só que o destino de Uhtred está inevitavelmente ligado a Alfredo, rei de Wessex, governante do único reino inglês a não se dobrar perante a fúria dos guerreiros do norte. Aos 11 anos Uhtred está em dúvida quanto à sua lealdade, mas uma matança em uma fria manhã de inverno o leva para o lado inglês, que a essa altura se encontra totalmente dominado pelos destemidos dinamarqueses.
O ÚLTIMO REINO é o primeiro volume de Crônicas Saxônicas, série que apresenta a história de Alfredo, o Grande, e de seus descendentes. Em torno desse lendário personagem histórico, Bernard Cornwell tece uma belíssima história de lealdade dividida, amor relutante e heroísmo desesperado. Uhtred, sem dúvida, é um dos personagens mais interessantes da longa galeria de heróis do autor, e O ÚLTIMO REINO, um de seus romances mais poderosos e apaixonados.
Depois d’As Crônicas de Artur e A Busca do Graal, eu, fiel adepto do mestre Cornwell, iniciei nos estudos saxônicos, digo, iniciei a leitura das Crônicas Saxônicas ─ série de, até o momento, 6 livros que narram o período em que o leste da Britânia, dominada há muito pelos saxões, se torna um reino concreto, região em que hoje conhecemos por Inglaterra.

Para quem leu As Crônicas de Artur, vai ser fácil se situar historicamente. Pois na época de Artur, século 5, a Britânia vivia em guerra civil entre seus senhores, e, ao mesmo tempo, esses mesmos senhores tentavam impedir as conquistas daqueles sujeitos de cabelos e olhos claros que chegaram pelo mar e tomaram a costa leste da ilha ─ os saxões. A época do Artur é marcada por este evento: a luta contra os saxões. E Artur, de modo geral, perdeu. Então os saxões se expandiram e 2 séculos mais tarde já tinham em mãos o território que hoje conhecemos por Inglaterra, ou seja, o leste e o sul da ilha. Os britânicos, derrotados, escorreram para os lados, se restabeleceram no oeste e no norte (hoje conhecidos como Pais de Gales e Escócia, respectivamente), conseguindo resistir à novas expansões dos saxões, e estes talvez tenham se conformado com a terra que possuíram ─ afinal, estavam no coração da ilha, na capital do reino britânico, com as melhores fortalezas, as maiores igrejas e seus enormes tesouros, os melhores portos e a melhor terra para se viver e produzir.

E agora, n’O ÚLTIMO REINO, a história se copia. Pois do mar do leste, o mesmo de onde chegaram os saxões (agora povo inglês) surgiram os novos conquistadores, vindos em navios de grandes velas, com escudos enfileirados nas amuradas e cabeças de feras (dragão, serpente, águia, cavalo) enfeitando as proas e popas de cada embarcação. Quem eram? Respondo: dinamarqueses.

Também chamados de vikings.

Então o livro começa no momento exato em que os dinamarqueses iniciam a conquista. Até a metade do livro, os caras já dominaram boa parte da Inglaterra, trucidando saxões ali e aqui, restando apenas uma última região ao sul para tomar. Daí o titulo do livro ─ pois restava somente um último reino a ser conquistado, e pronto, os dinamarqueses teriam aquela terra fértil nas mãos; exatamente como aconteceu com a invasão saxã e a derrota dos britânicos, 3 séculos mais cedo.

E aqui abro um parênteses repetitivo: História: é inspiradora e atraente de se estudar quando o professor é igualmente inspirador. E Bernard Cornwell é tão inspirador que te faz querer viver a história. É o melhor dos professores.

E é também um escritor genial. Seu texto é rápido demais, violento demais, caótico demais. Ou seja, a perfeita personificação daquela época de conflitos. Aqui, o protagonista é Uhtred, um jovem saxão do norte da Inglaterra, que logo de inicio perde tudo, graças aos dinamarqueses que chegaram em suas terras, estriparam os homens, estupraram as mulheres e escravizaram os jovens. Uhtred foi um dos “escravizados”, com o pequeno detalhe de que seu senhor passou a lhe tratar como um filho, tanto que alguns anos mais tarde Uhtred já se considerava um dinamarquês. Mas, como disse a sinopse, o caos surge, e Uhtred se vê novamente com o seu povo, os ingleses/saxões. Há então, um choque de consciência no personagem, e com o tempo ele entende que é preciso primeiro sobreviver, e depois correr atrás de seus ideais, ainda que seus ideais estejam nebulosos em sua mente.

Então ele conhece o rei. O seu rei: Alfredo ─ o antagonista da série. Mas não vou falar sobre Alfredo aqui. Muito em breve, na postagem sobre o livro 2, ei de descrever melhor o sujeito.

Voltando para Uhtred: Como o livro é narrado em primeira pessoa pelo protagonista, a impressão que se tem é que Uhtred deve ser um sujeito velho e acomodado, já com poucas metas a atingir na vida. Parece estar sentado em sua cadeira, com as mãos juntas e dedos entrelaçados; ao alcance da mão, uma jarra de vinho e um cálice bem trabalhado; aos pés, um de seus cachorros; à sua frente, algum ouvinte ou escriba; e em seus lábios, a narrativa.

Pois é como se o protagonista estivesse contando a próprio passado numa conversa informal. E, assim como um contador de histórias, ele pula momentos triviais (tanto que ele tem 10 anos quando tudo começa, e ao fim do livro, está com 20) e se demora um pouco em instantes mais importantes (batalhas, perseguições, negociações). E essa construção, essa forma de desenvolver a história, é simplesmente perfeita, sem nunca cansar o leitor.

Outro ponto forte, assim como li numa resenha, é as religiões. N’As Crônicas de Artur (só para relembrar: século 5) o cristianismo tenta se propagar ao passo que luta contra os ditos pagãos ─ os druidas. N’A Busca do Graal (século 15) o cristianismo já é febre geral, e a inquisição é a autoridade de Deus para lidar com os hereges. E nas Crônicas Saxônicas (século 8) temos Woden e sua mitologia.

Woden. Ou, se preferir: Odin.

Exato! Mitologia Nórdica é o pátio religioso de Bernard Cornwell nessas crônicas. Então o leitor vai ouvir algumas coisas sobre o Valhala, Asgard, Odin, Tor (ou Thor), Hel (deusa dos mortos, se bem me lembro), e outros deuses e conceitos que tecem a religião dos vikings.

Vou ficar por aqui. O ÚLTIMO REINO merecia mais alguns comentários, mas, a fim de evitar a escassez de criatividade em meus textos, vou guardá-los para os futuros textos sobre os próximos livros dessa série, que, inevitavelmente, estou devorando com a mesma fúria berserk da lenda viking.

Ah, aliás, recomendo muito a leitura.

2 comentários:

  1. É inacreditável como nunca me sobrou tempo/ ânimo para começar a ler este grande tomo.

    Após esta resenha, hei de mudar este fato...

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    1. Odin, essa série é ideal pra tu! Só digo que é impossivel ler os livros de forma lenta. A rapidez dos acontecimentos cobra de você a mesma rapidez em desbravar o que virá nas próximas páginas. É um negócio sobrenatural. Enfim.

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